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Artigo
6 de julho de 2018
Um “serviçal do agronegócio associado ao imperialismo”
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POR CNA

Assim me taxou um internauta após ler meu artigo, semana passada, sobre agrotóxicos. Li, e encuquei: o que motiva um sujeito a pensar assim?

Rolei a timeline e, curioso, comecei a assuntar na rede. Deparei-me com uma comunidade bastante ativa, na maioria jovens de classe média ligados ao PSOL. Seus argumentos e seus xingos formam uma ideologia, assim conclui, que se poderia denominar de “esquerdismo verde”.

O esquerdismo verde, entre outras causas, combate o uso de agrotóxicos à semelhança do ecologismo tradicional. Mas deste se diferencia por ser, basicamente, um movimento anticapitalista. Ecologistas sérios são, ideologicamente, isentos, nem da esquerda, nem da direita. Esquerdistas verdes, não. Querem derrubar o sistema econômico.

Daí vem o ódio que demonstram, em geral, ao agronegócio. Eles demonizam o atual modelo tecnológico de produção no campo, caracterizado, segundo eles, pelo domínio das grandes empresas. Acham que as multinacionais – Basf, Bayer, Monsanto, Syngenta, Du Pont, entre outras – representam o mal sobre a terra. Unidas, querem desgraçar o meio ambiente.

Alternativamente, o esquerdismo verde defende um modelo de agricultura familiar, autossuficiente, baseado em técnicas de produção “agroecológicas”. Vão mais longe: detratam a “agricultura de exportação”, como dizem ser a sojicultura. Para eles, importante é produzir o arroz com feijão e mandioca.

Pouco importa, aos esquerdistas verdes, entender a dinâmica e as exigências de qualidade dos mercados competitivos. Desprezam eles, igualmente, as tendências globais do avanço tecnológico no campo. Desdenham, ainda, a busca do lucro como fator estimulante da produção. Divisas via exportação, para que?

Sim, os esquerdistas verdes são, essencialmente, retrógrados. Defendem um modelo de produção agrária tipo o campesinato europeu de meados do século 20. Imaginam, no Brasil, ser possível alimentar 210 milhões de pessoas com hortas domésticas e lavouras capinadas com enxada, pragas combatidas com calda de fumo, colheitas feitas à mão. Volta ao passado.

A pregação dos esquerdistas verdes se aproxima das ideias de E. F. Schumacker, expostas em seu famoso livro Small is beautiful (1973). O alemão, radicado na Inglaterra, propunha naquela época uma sociedade alternativa baseada em pequenas propriedades e com negócios locais. Importante, dizia, era valorizar as relações humanas. Empolgou a contracultura.

Naquele tempo a saudosa Elis Regina cantava bucolicamente “eu quero uma casa no campo”, romanceando a pacata vida rural para mostrar seu desgosto com as paranoias da metrópole. Coitada, morreu de overdose. Nada freou a evolução da sociedade.

Houve uma explosão populacional. De 3 bilhões em 1960, a população humana atingiu 4 bilhões em 1974. Desde então, a cada 12,5 anos, em média, a humanidade acrescenta 1 bilhão de almas na Terra. Essas multidões, urbanizadas e com renda crescente, demandam comida e matérias-primas, pressionando a expansão da agropecuária mundial. Goste-se ou não, este é o mundo em que vivemos.

Os agricultores não utilizam agrotóxicos por prazer. Adorariam se livrar desse oneroso, e muitas vezes perigoso, insumo. Pode ser que, no futuro, se consiga – com mais, não com menos tecnologia – superar a dependência agrícola aos pesticidas químicos. Nos limites do conhecimento científico existente, porém, e dada a demanda mundial por alimentos, banir sua utilização causaria um “efeito Thanos”, daquele vilão do filme Vingadores – Guerra Infinita: possivelmente metade da humanidade pereceria.

Na agricultura sustentável que defendemos nós os agrônomos, a aplicação de pesticidas deve estar sujeita a critérios e normas da boa prática agrícola (BPA). Idem aos remédios controlados. Os esquerdistas verdes, com certeza, não trocam os poderosos antibióticos por chás de losna no combate das doenças infecciosas, uma tuberculose, por exemplo. Por que, então, querem ferrar o produtor rural?

Os politizados esquerdistas verdes são obscurantistas. Desmerecem os cientistas da agropecuária. Desprezam a inteligência agronômica e biológica existente na Embrapa, na ESALQ/USP, nas universidades, nos laboratórios. Dizem que todos nós queremos envenenar a comida e destruir a natureza, a mando das multinacionais. É patético.

Por último, os esquerdistas verdes são dogmáticos. Por acreditarem ser os donos da verdade, não gostam de interlocução, de diálogo. Julgam-se os defensores únicos da vida. Parecem os Vingadores ecológicos.

Xingam a todos nós ligados ao agronegócio. Depois, vão comer uma picanha.

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* Xico Graziano, 65, é engenheiro agrônomo e doutor em Administração. É professor de MBA da FGV e sócio-diretor da e-PoliticsGraziano. 

Publicado em  Poder 360 - 04/07/2018

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